Nicole Blackman - Blood Sugar

"remember how a friend said he hated blowjobs
because they made women subservient
you said he was crazy
because woman is never more powerful
than whe she has
a man's jewels in her mouth.

wonder why they call them blow jobs.
blowing has nothing to do with it."











As palavras cortam como facas à medida que as lemos. Outras formam-se na nossa cabeça folheando as páginas deste livro, ou ouvindo-as numa das colaborações musicais onde podemos escutar a voz e tom muito particular desta autora, em que a fronteira entre o sensual, perturbador e incomodativo é várias vezes difícil de delinear.

Nicole Blackman é um gosto adquirido. Poetisa e artista de spoken word, tomei contacto com ela através do Blitz quando este era ainda um jornal, e por causa do lançamento do álbum Dead Inside dos Golden Palominos em 1996, onde a banda musicava as palavras de Nicole. O álbum é uma experiência no verdadeiro sentido da palavra (escrevi sobre ele aqui), tendo havido por cá peças de teatro baseadas no mesmo, com os textos desse álbum a surgirem neste livro também, assim como os das suas colaborações com os Recoil, por exemplo.

Mesmo assim nada se compara com ver esta artista ao vivo, como tive a felicidade de o fazer há uns bons anos atrás num festival de spoken word no Porto, em que além dela também estiveram presentes Adolfo Luxúria Canibal dos Mão Morta e Michael Gira dos Swans, entre outros, num evento que ainda hoje é das experiências mais gratificantes e perturbadoras que já pude assistir na minha vida. Os minutos finais, palco às escuras, ela de vestido branco, banhado em sangue que ia retirando aos poucos de um recipiente, fazendo rodopiar ao mesmo tempo por cima da cabeça uma lanterna que nos ia dando flashes de luz da sua figura, credo. Todo o público em silêncio durante e após o espectáculo, só começando a respirar e a falar pouco depois, quando já estávamos na rua. Não há palavras para descrever o que se passou ali.

Este livro já não é recente, datando de 2000, reunindo muitos dos textos que podiam ser encontrados noutros livros da autora editados em versões muito limitadas, em colaborações musicais e por aí adiante. A maneira como ela descreve, muitas vezes na primeira pessoa, histórias tão reais que podiam ser a de qualquer um de nós ou de alguém que conhecemos, é apenas um dos aspectos que nos cativa. Para quem tenha dúvidas, nada como escutar 'Victim' do referido álbum dos Golden Palominos.

Crime, violência, paixão, Apocalipse, relações intensas, extremas, lugares comuns, um mundo em que no caos encontramos a ordem, restando saber até que ponto queremos entrar nele. O sabor é tão amargo como deliciosamente doce após os primeiros contactos.

"Holy"

I eat only sleep and air
and everyone thinks I'm dumb
but I'm smart because I've figured it out.

I am slimmer than you are
and I am burning my skin off little by little
until I reach bone and self
until I get to where I am essential
until I get to where I am

Food doesn't tempt me anymore
because I am so full of energy and sense
I can even pass by water now
because I am living off the parts of me
that I don't need anymore.

I could feel the slow drips of pain before,
swirling inside where my lungs should have been.
Now I'm clean inside.

I threw out hundreds of things that I didn't need anymore.
All my dresses and bras
stupid things like jeans and socks.
Most days I float through the house naked
so I can see myself in the mirrors.
I have hundreds of them everywhere
and they talk back to me all the time.
They keep me true and pure.
They make sure I'm still here.

When I knew what I had to do
I took all my notebooks, all my manuscripts
and ate them page by page
so I could take my words with me.

I can finally control my life
and even death
and I will die slowly like steam escaping from a pipe.

This is my greatest performance
and all of the actresses who won my parts will say
how wonderful to let yourself go that mad,
how wonderful to go on this kind of journey
and not care if you come back to tell the story.

I scratch words on the walls now
so people will visit this museum and know
how someone like me ends up like this
(they'll say there is art in here somewhere).

Everything that comes out of me is sacred
every tear, every cough, every piss.
Everything that comes off of me is sacred
every fingernail, every eyelash, every hair.

Starvation is sacred and I scratch my bones
against the windows at night.
I light candles and feel myself evaporate.
This body is a little church, a little temple.
You can't see me now because I've gone inside.

My family doesn't call anymore.
My friends don't call anymore.
You can't hurt me anymore.
They can't hurt me anymore.
Only I can.

And that's okay.
I don't need them anymore.
I can live off of me.
I speak to me.
I dance with me.
I eat me.

When they find me, I'll have a little smile on my face
and they'll wrap me in a white cloth and lay me in the ground
and say they don't understand.
But I do.
I don't hurt anymore.
I'm not lonely anymore.
I'm not sad I'm not pretty anymore.
I made it through.

I feel so holy and clean when I stretch out on the floor and sing.
Sometimes god comes in for a minute and says I'm doing fine,
I'm almost there.

Every day I get a little closer to vanishing.
Some days I can't stand up because the room moves under my feet
and I smile because I'm almost there,
I'm almost an angel.

One day when I am thin enough
I'll go outside
fluttering my hands so I can fly
and I will be so slight that I will pass through all of you
silently
like wind.

2 comentar

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K
admin
17 março, 2008 21:33 ×

Ui! Tenho que encontrar isso dos Golden Palominos. Esta mulher é qualquer coisa. Faltam-me as palavras para descrever a maneira como ela interpreta as músicas porque é arrebatadora, de nos deixar o fôlego suspenso. Deu-me para pesquisar o nome dela porque recentemente voltei a ouvir o álbum Liquid de Recoil, que é um dos meus predilectos em grande parte dado às letras e vocalizações dela que casam de maneira perfeita com o ambiente musical criado pelo Adam Wilder. Fiquei contente ao encontrar estas informações. Grazie. (e é sempre bom encontrar mais alguém que conheça Recoil)

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17 março, 2008 21:59 ×

Hi e bem vinda ao meu blog e thx pelo comment. :)

Eu adoro o trabalho dela, e se não conheces esse álbum de Golden Palominos, então prepara-te porque é mesmo daqueles que não deixam uma pessoa indiferente, nem que seja por nos deixar quase incomodados e desconfortáveis, tal a maneira como ela descreve as coisas, e devido aos assuntos abordados também. Ainda por cima esta Victim é logo a primeira do álbum, em ficas mesmo *whoa, isto é muito à frente*

É meio peculiar que os Golden Palominos não lançaram mais nada como o Dead Inside na carreira deles. Quem sabe na altura tenham deparado com o trabalho da Nicole e tenham ficado apaixonados com ele e decidiram fazer um álbum só com ela, who knows. É um pouco difícil de ouvir todo do início ao fim, ou muitas vezes, porque nem sempre temos a disposição para entrar nestes universos.

Pode ser tendencioso da minha parte, mas é precisamente as faixas de Recoil em que ela participa que mais gosto, porque é mesmo isso, a maneira como voz se encaixa de maneira perfeita nos fundos musicais criados pelo Alan Wilder. :)

É giro porque eu decidi escrever sobre este livro após tanto tempo, porque nessa semana também voltei a andar viciado de novo no Liquid. ;)

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