«Alvorada, reconheço nos primeiros comboios o som que me acorda para as noites, nos tecidos que envolvem filigranas perdidas e tesouros mal escondidos, caminhos sinuosos.
Pedi-te terminantemente para não olhares para os desenhos que faço com as nuvens, tatuagens, casaco de cabedal, sei que os bicos rosados, cheios, incomodados pela camisola justa, às riscas, te atraem, como sei do silêncio com que gostas de fazer amor. Tens de saber esperar.
Candeeiros, luz amarelada, gosto, das sombras na parede, dos movimentos, descoordenados, impulsivos, do ímpeto do vento nos lençóis, de nós, sozinhos pela casa, sem ninguém a chatear-nos pelas horas a que nos deitamos. Pequenas coisas, sim, mas tão enormes dentro de mim, como tu, deitado agora ao meu lado, respiração, não seria a primeira vez que me permitia cortá-la, as frases inacabadas, deitadas fora, não têm lugar aqui, mas espera, não percas o rumo ainda, há que expelir o coração primeiro, muito antes da rotina corriqueira de me encheres de ti, longe das maravilhas dos naufrágios da mente e perto o suficiente para te conseguires encarar ao espelho.
Consegues? Consegues cuspir-me assim, como te peço?
Corta-me as veias pelo menos, faz algo, sê um homem caramba, sê bruto se necessário, não deixes é estes alicerces toldarem o que te vai na cabeça, nos braços, nas mãos, engole-me de uma vez.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
2011
Pedi-te terminantemente para não olhares para os desenhos que faço com as nuvens, tatuagens, casaco de cabedal, sei que os bicos rosados, cheios, incomodados pela camisola justa, às riscas, te atraem, como sei do silêncio com que gostas de fazer amor. Tens de saber esperar.
Candeeiros, luz amarelada, gosto, das sombras na parede, dos movimentos, descoordenados, impulsivos, do ímpeto do vento nos lençóis, de nós, sozinhos pela casa, sem ninguém a chatear-nos pelas horas a que nos deitamos. Pequenas coisas, sim, mas tão enormes dentro de mim, como tu, deitado agora ao meu lado, respiração, não seria a primeira vez que me permitia cortá-la, as frases inacabadas, deitadas fora, não têm lugar aqui, mas espera, não percas o rumo ainda, há que expelir o coração primeiro, muito antes da rotina corriqueira de me encheres de ti, longe das maravilhas dos naufrágios da mente e perto o suficiente para te conseguires encarar ao espelho.
Consegues? Consegues cuspir-me assim, como te peço?
Corta-me as veias pelo menos, faz algo, sê um homem caramba, sê bruto se necessário, não deixes é estes alicerces toldarem o que te vai na cabeça, nos braços, nas mãos, engole-me de uma vez.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
2011
as sombras nas paredes
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