Escrita em estado bruto, com as palavras a jorrarem para o papel com vontade própria. É muito característico chamar-se inspiração a tal fenómeno e há quem defenda que é assim que deve ficar um livro no seu estado final, sem alterações. Há uns anos talvez pensasse dessa forma no que toca ao meu processo criativo, actualmente não.
Essa primeira etapa é importante e define o grosso do conteúdo, a cadência das palavras, das frases, a essência da nossa voz, mas pouco depois entra o que posso chamar de exercício criativo deliberado, de apuração das camadas que podem proporcionar outras leituras a quem o decidir fazer. E nesse sentido, falarei um pouco mais dos livros Histórias em Cellophane e Moléculas, assim como do próximo que está em curso.
Um primeiro contacto com os referidos livros é passível de demonstrar, quase imediatamente, parte dessas camadas. O cuidado estético, a descrição na ficha técnica do tipo de papel e caracteres, o cruzamento de áreas criativas diferentes. Os próprios marcadores, vídeos promocionais ou até os postais e podcasts que serviram de recompensa extra para algumas das pessoas que apoiaram a campanha, são peças deste enorme puzzle sensorial. Pouco depois, com a leitura, poderá perceber-se a ligação às fotografias, às ilustrações, o primeiro potencial das narrativas com as quais tende a identificar-se o leitor. Os narradores, crípticos o suficiente, a linguagem, o ritmo poético, as ligações que a dada altura se podem identificar nos dois livros, com a personagem vincada do segundo a sentir-se que também aparece no primeiro apesar de não existir aí uma menção directa ao seu nome. Nada é um acaso. Mas para chegarmos aqui existiu muito trabalho de edição. Mudanças de palavras, retoques em frases, parágrafos reescritos ou acrescentados, alterações de fotografias, mudar ligeiramente algumas paginações para evitar palavras soltas, ordenar os textos. As próprias diferenças entre os dois livros são propositadas, uma tentativa de apresentar olhares diferentes, de construção narrativa e um pouco do que me move ou do que sou capaz de fazer. Deslindar todas as camadas, os mistérios e os significados por detrás dos textos não será fácil, ou até dos livros em si. Digo-o por consciência, porque pouco ali é óbvio e muito pode ser obtuso, mas leve e inócuo não será certamente. Ou pelo menos é essa uma das intenções.
E tempo para digerir isto tudo, para sentir ou para pensar sobre o que possa estar aqui, num mundo cada vez mais apressado e onde uma boa fatia da população sofre de défice de atenção? Suicídio criativo? Estarei eu a sugerir que parte do que me move é um convite a pausas neste dia-a-dia desenfreado? Seguramente, mas sem imposições de alguma espécie.
No seguimento de toda esta lógica, o próximo livro aponta para um caminho com semelhanças. O facto de estar a ser escrito num formato diferente dos dois aqui referidos, por exemplo, demonstra uma vontade de tentar evoluir e de não oferecer aos leitores mais do mesmo. O título, há muito definido, será logo um dos primeiros sinais de que nada é o que parece, de eventuais contradições propositadas. Após três capítulos e umas vinte páginas (com o rumo da história planeado na cabeça), posso igualmente revelar, sem grande surpresa diriam, que a narrativa terá várias camadas. Parte delas vão ao encontro da ideia de que aquelas linhas que estamos a ler podem não ser o que parecem, ou que deve existir precaução na hora de serem interpretadas de forma literal. E já aqui, nesta etapa jovial do livro, competem entre si as facetas da inspiração e do exercício criativo. A minha maneira de escrever, voz ou essência, conforme preferirem, surgiu de forma vincada, naturalmente, desde os instantes iniciais. Isso não impediu, pouco depois, que arestas tenham sido limadas nos primeiros capítulos, que se tenha apurado a clareza de algumas passagens, ou definido melhor certos diálogos e características de quem narra a história, entidade fulcral do livro e que, curiosamente, é de uma natureza diferente das que narram os dois livros anteriores. Ou, até, que tenha feito alguns testes de impressão em papel para olhar para a mancha de texto.
Mais do que uma separação, tende a existir é uma conjugação destas duas facetas, a tal ponto que, por vezes, nem se percebe bem onde uma começa e a outra acaba. O propósito deste artigo está na reflexão sobre estes processos, mas também em partilhar um pouco mais sobre estes livros, com destaque para o próximo que conto terminar algures este ano.
Essa primeira etapa é importante e define o grosso do conteúdo, a cadência das palavras, das frases, a essência da nossa voz, mas pouco depois entra o que posso chamar de exercício criativo deliberado, de apuração das camadas que podem proporcionar outras leituras a quem o decidir fazer. E nesse sentido, falarei um pouco mais dos livros Histórias em Cellophane e Moléculas, assim como do próximo que está em curso.
Um primeiro contacto com os referidos livros é passível de demonstrar, quase imediatamente, parte dessas camadas. O cuidado estético, a descrição na ficha técnica do tipo de papel e caracteres, o cruzamento de áreas criativas diferentes. Os próprios marcadores, vídeos promocionais ou até os postais e podcasts que serviram de recompensa extra para algumas das pessoas que apoiaram a campanha, são peças deste enorme puzzle sensorial. Pouco depois, com a leitura, poderá perceber-se a ligação às fotografias, às ilustrações, o primeiro potencial das narrativas com as quais tende a identificar-se o leitor. Os narradores, crípticos o suficiente, a linguagem, o ritmo poético, as ligações que a dada altura se podem identificar nos dois livros, com a personagem vincada do segundo a sentir-se que também aparece no primeiro apesar de não existir aí uma menção directa ao seu nome. Nada é um acaso. Mas para chegarmos aqui existiu muito trabalho de edição. Mudanças de palavras, retoques em frases, parágrafos reescritos ou acrescentados, alterações de fotografias, mudar ligeiramente algumas paginações para evitar palavras soltas, ordenar os textos. As próprias diferenças entre os dois livros são propositadas, uma tentativa de apresentar olhares diferentes, de construção narrativa e um pouco do que me move ou do que sou capaz de fazer. Deslindar todas as camadas, os mistérios e os significados por detrás dos textos não será fácil, ou até dos livros em si. Digo-o por consciência, porque pouco ali é óbvio e muito pode ser obtuso, mas leve e inócuo não será certamente. Ou pelo menos é essa uma das intenções.
E tempo para digerir isto tudo, para sentir ou para pensar sobre o que possa estar aqui, num mundo cada vez mais apressado e onde uma boa fatia da população sofre de défice de atenção? Suicídio criativo? Estarei eu a sugerir que parte do que me move é um convite a pausas neste dia-a-dia desenfreado? Seguramente, mas sem imposições de alguma espécie.
No seguimento de toda esta lógica, o próximo livro aponta para um caminho com semelhanças. O facto de estar a ser escrito num formato diferente dos dois aqui referidos, por exemplo, demonstra uma vontade de tentar evoluir e de não oferecer aos leitores mais do mesmo. O título, há muito definido, será logo um dos primeiros sinais de que nada é o que parece, de eventuais contradições propositadas. Após três capítulos e umas vinte páginas (com o rumo da história planeado na cabeça), posso igualmente revelar, sem grande surpresa diriam, que a narrativa terá várias camadas. Parte delas vão ao encontro da ideia de que aquelas linhas que estamos a ler podem não ser o que parecem, ou que deve existir precaução na hora de serem interpretadas de forma literal. E já aqui, nesta etapa jovial do livro, competem entre si as facetas da inspiração e do exercício criativo. A minha maneira de escrever, voz ou essência, conforme preferirem, surgiu de forma vincada, naturalmente, desde os instantes iniciais. Isso não impediu, pouco depois, que arestas tenham sido limadas nos primeiros capítulos, que se tenha apurado a clareza de algumas passagens, ou definido melhor certos diálogos e características de quem narra a história, entidade fulcral do livro e que, curiosamente, é de uma natureza diferente das que narram os dois livros anteriores. Ou, até, que tenha feito alguns testes de impressão em papel para olhar para a mancha de texto.
Mais do que uma separação, tende a existir é uma conjugação destas duas facetas, a tal ponto que, por vezes, nem se percebe bem onde uma começa e a outra acaba. O propósito deste artigo está na reflexão sobre estes processos, mas também em partilhar um pouco mais sobre estes livros, com destaque para o próximo que conto terminar algures este ano.
ConversionConversion EmoticonEmoticon