Os posters de Sándor Bortnyik: Uma das faces do Modernismo Húngaro


Existem alguns elementos comuns nas conversas relacionadas com a Hungria. Um deles é o desconhecido. Quem toma contacto com certas facetas da cultura húngara dá por si a perceber que tem coisas maravilhosas, mas que não passam para fora pelos mais variados motivos. Vinhos ou cervejas com fama de serem muito bons, mas que depois são quase impossíveis de encontrar à venda noutros países nas lojas especializadas em importação desses produtos. Músicos e escritores talentosos, com toques de génio, mas que poucos ainda hoje conhecem. Artistas fantásticos na arte dos posters, mas raros os trabalhos que aparecem em publicações não nativas sobre o tema.

Se por um lado existe a sensação de que os húngaros ainda são um povo fechado, no sentido que têm pouco interesse em conviver ou em mostrar/exportar as suas qualidades para o público estrangeiro, por outro a falta de curiosidade ou de conhecimento também parece abundar por quem é de fora.


Os posters húngaros, apesar de aclamados internacionalmente em certos círculos e vendidos a preços exorbitantes, continuam a ser um estranho segredo. Nos últimos tempos, por gosto, para conhecer, para aprender e para investigar, tenho investido consideravelmente em publicações dedicadas a esta arte. Encontrar os poucos livros húngaros com texto em inglês (ou noutra língua que se consiga ler) pode não ser fácil, mas são uma peça essencial para entender e conhecer este mundo fascinante. Em contraste, noutros livros, bastante volumosos por sinal, que tratam da história global desta arte ou de épocas específicas, é normal encontrarmos dentro deles de um a cinco posters húngaros, com sorte. Até aqui, na Internet, é difícil encontrar muitos trabalhos.


Uma época que muito me apraz é a que abrange os anos 20 e 30, que contém trabalhos maravilhosos. Alguns deles tive a oportunidade de ver ao vivo há uns meses, como dei conta anteriormente. O livro da exposição respectiva é absolutamente obrigatório. Não só tem imensos trabalhos geniais, como as reproduções são de excelente qualidade e em tamanho generoso. O uso magistral de formas geométricas, a criatividade, o Modernismo tomou conta do design gráfico numa explosão inventiva que aliava várias tendências. Construtivismo, Funcionalismo, Expressionismo, Cubismo.


Um dos principais precursores deste estilo na Hungria, juntamente com Róbert Berény e Lajos Kassák, foi Sándor Bortnyik. Nascido em 1893, desde cedo começou a interessar-se por pintura, pela arte dos posters, pela escrita e pela evolução dos movimentos intelectuais avant-garde de esquerda.

Em 1919, durante o curto período (21 de Março de 1919 a 1 de Agosto de 1919) em que a Hungria foi governada pelo que se chamou de República Soviética da Hungria (união do Partido Social Democrata da Hungria e do Partido Comunista da Hungria), teve um papel importante nas reformas ligadas às artes. Com a queda desse regime, foi forçado a emigrar para Viena, na Áustria, prosseguindo depois para Weimar, na Alemanha, local onde existia a icónica escola de design gráfico, artes plásticas e arquitectura de vanguarda, Bauhaus.


Os anos que Sándor Bortnyik esteve em Weimar, 1922-1923, foram fundamentais para aperfeiçoar algumas das ideias gráficas abstratas que já andava a executar com colegas. Na altura deram a essas ideias o nome de képarchitektúra (imagem-arquitectura), considerado como a versão Húngara do Construtivismo. As aulas que teve com Theo Van Doesburg, fundador do movimento/jornal De Stijl, também acabariam por exercer a sua influência.

Bortnyik regressa à Hungria em 1925 e, além de inúmeras outras actividades ligadas às artes, seria responsável pela criação de uma escola artística privada importante, a Műhely (Oficina), que existiu entre 1928 e 1938. Apelidada de Bauhaus Húngara, esta escola teve um papel proeminente na evolução dos posters húngaros.


Cores fortes, uso exímio da tipografia, o bailado das formas geométricas e um humor muito particular nos trabalhos. Sándor Bortnyik é um dos artistas húngaros mais importantes nesta área pelo papel que teve na sua evolução e pela abordagem diferente. Quando ele e outros artistas como Róbert Berény (responsável por alguns dos melhores posters que já vi) regressaram à Hungria, as pessoas ficaram fascinadas quando os primeiros posters começaram a surgir nas ruas. A novidade foi tal que existia uma ansiedade por parte do público para ver qual seria a próxima criação afixada nos carismáticos painéis redondos publicitários espalhados pelas cidades. Alguns dos cartazes mais memoráveis são os que promoviam a marca Modiano, que mais não era do que papel para enrolar cigarros, vulgo mortalhas.


Depois da Segunda Guerra Mundial, Sándor Bortnyik chegou a ensinar na Academia Húngara de Artes Aplicadas e foi Director na Academia Húngara de Belas Artes, além de redactor na publicação Free Art, entre outros projectos. Faleceu em 1976, em Budapeste.