«Rios de tinta, ficamos com uma cor diferente nas mudanças sazonais, na pressa de chegarmos ao motel com quartos espelhados no IC19 que nos abre as portas quando o espaço contíguo do carro já não é suficiente. Estamos saturados daqueles vidros.
A senhora, de olhar distraído, roupas frouxas no corpo e melancolia estampada no rosto, recebe-nos depois de limparmos os pés exaustivamente no tapete da entrada, não sem antes roçar o meu nariz ao de leve na porta, só assim consigo entrar e encarar as paredes de qualquer edifício, sentindo-lhes o cheiro.
A chave, pousada no balcão com desinteresse, tem a textura das nuvens. O quarto, decorado de maneira simples, tem ao centro uma cama de casal, num dos cantos um cabide, noutro uma mesinha de cabeceira com um candeeiro que se acende com o interruptor encaixado na ombreira da porta. A luz, fria a início, torna-se mais quente com o regulador tonal que nos permite mudar a ambiência do espaço, os espelhos, esses, estão presentes em todo o lado.
Sem tempo para brincarmos com os botões das camisas, da saia ou das calças, rasgamos as roupas e ficamos apenas com as gravatas enfaixadas nos pescoços, a sensação é estranha, com os reflexos a permitirem que entremos em nós de cada vez que entramos um no outro. Cada orifício deve ser amado da mesma forma, crua, inteira, única, sem lubrificantes, um âmago no que toca à derrocada das defesas. Os castelos, foram feitos para serem deitados abaixo.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
2011
A senhora, de olhar distraído, roupas frouxas no corpo e melancolia estampada no rosto, recebe-nos depois de limparmos os pés exaustivamente no tapete da entrada, não sem antes roçar o meu nariz ao de leve na porta, só assim consigo entrar e encarar as paredes de qualquer edifício, sentindo-lhes o cheiro.
A chave, pousada no balcão com desinteresse, tem a textura das nuvens. O quarto, decorado de maneira simples, tem ao centro uma cama de casal, num dos cantos um cabide, noutro uma mesinha de cabeceira com um candeeiro que se acende com o interruptor encaixado na ombreira da porta. A luz, fria a início, torna-se mais quente com o regulador tonal que nos permite mudar a ambiência do espaço, os espelhos, esses, estão presentes em todo o lado.
Sem tempo para brincarmos com os botões das camisas, da saia ou das calças, rasgamos as roupas e ficamos apenas com as gravatas enfaixadas nos pescoços, a sensação é estranha, com os reflexos a permitirem que entremos em nós de cada vez que entramos um no outro. Cada orifício deve ser amado da mesma forma, crua, inteira, única, sem lubrificantes, um âmago no que toca à derrocada das defesas. Os castelos, foram feitos para serem deitados abaixo.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
2011
sons de um motel com espelhos no ic19
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