«Serenidade, corte de respiração, um gosto pelos pormenores, os sofás, centrados de maneira meticulosa com as sombras, a mesa, com tampo de vidro, encostada à beira de um piano.
Os convidados, entram pela porta à direita, a da esquerda, essa, está reservada para ti. A fechadura, forrada a algodão, permite-te entrar no meu peito, filigranas nos ossos, sonhos de perpetuidade, aroma a alecrim nas veias, precisas de um candelabro para as ver, pequeninas, são minúcias, enroladas em ritmos oscilantes, espalhadas pelas cortinas esbranquiçadas que perderam há muito o verde do princípio do tempo, do nosso tempo, dos relógios quebrados nos orifícios corporais.
Esta casa, perdida na cidade da luz, conta histórias nas suas paredes, desenhadas a fotografias do mundo, monocromáticas, coloridas, sem definição, dá gosto esquecer os passos no soalho, reconheço o número que calçamos, os nossos dedos, o pó, esse, dá uma testemunha excepcional.
Naquele buraco, onde antes residia um olho, encontra-se o infinito, sabemos disso, de quem perscruta o impossível, tão ali, sempre, nas cadeiras onde fizemos amor, onde escrevemos os nomes com as lâminas do nosso primeiro jogo de cozinha, sabe bem voltar a ter seis anos de idade, quando tudo é permitido e os cabelos são criaturas livres, pintados com rebeldia, agarrados com força, contra a cama, contra os móveis, contra os lábios, gengivas em sangue, cheiro a álcool, acordar com o amanhã numa varanda, nus, de cigarro numa mão e pequeno-almoço no chão de pedra.
Eternidade.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
2011
Os convidados, entram pela porta à direita, a da esquerda, essa, está reservada para ti. A fechadura, forrada a algodão, permite-te entrar no meu peito, filigranas nos ossos, sonhos de perpetuidade, aroma a alecrim nas veias, precisas de um candelabro para as ver, pequeninas, são minúcias, enroladas em ritmos oscilantes, espalhadas pelas cortinas esbranquiçadas que perderam há muito o verde do princípio do tempo, do nosso tempo, dos relógios quebrados nos orifícios corporais.
Esta casa, perdida na cidade da luz, conta histórias nas suas paredes, desenhadas a fotografias do mundo, monocromáticas, coloridas, sem definição, dá gosto esquecer os passos no soalho, reconheço o número que calçamos, os nossos dedos, o pó, esse, dá uma testemunha excepcional.
Naquele buraco, onde antes residia um olho, encontra-se o infinito, sabemos disso, de quem perscruta o impossível, tão ali, sempre, nas cadeiras onde fizemos amor, onde escrevemos os nomes com as lâminas do nosso primeiro jogo de cozinha, sabe bem voltar a ter seis anos de idade, quando tudo é permitido e os cabelos são criaturas livres, pintados com rebeldia, agarrados com força, contra a cama, contra os móveis, contra os lábios, gengivas em sangue, cheiro a álcool, acordar com o amanhã numa varanda, nus, de cigarro numa mão e pequeno-almoço no chão de pedra.
Eternidade.»
Nuno Almeida
Histórias de raparigas com casacos de cabedal e braços cobertos com pulseiras
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