100 kmh, em linha recta, à procura de uma mudança que não existe na caixa de velocidades. Os túneis por onde passo não me oferecem escuridão suficiente, sensações de resolução ou papéis que possa interpretar neste palco iluminado por candelabros bordados a cetim.
O carro oscila com o que me vai na cabeça e com o estado do piso, com as vozes que ecoam no vácuo.
Mão esquerda de fora da janela, pele arrepiada, braço a sentir o ar, deixo a cinza cair deste cigarro marcado pelo vermelho dos meus lábios, com o fumo a subir lentamente para a atmosfera, fazendo desenhos à medida que se torna num astronauta a explorar mais um espaço e mais uma estrela.
Estou liberta, solta, sem nada que me prenda.
Sinto-me bem agora, de cada vez que me elevo acima dos prédios e das nuvens para observar os faróis nas noites, a maneira como eles se partem em quatro na hora dos reflexos e dos segredos que se partilham com as pessoas mais íntimas. Embebida pela vertigem, parto à conquista de miragens e insatisfações, de um sinal de humanidade e consciência, de um abismo que me possa acolher e abraçar.
As paredes desfocam-se consoante a velocidade aumenta, os sinais perdem-se no verdadeiro sentido da palavra e as minhas costas exibem as cicatrizes de cada frustração e desencontro com o amor e o acaso. Se existem anjos neste mundo eles ainda não me encontraram."
Abismos (2008-2009)
Fotografia: Lúcia Costa
Palavras: Nuno Almeida
O carro oscila com o que me vai na cabeça e com o estado do piso, com as vozes que ecoam no vácuo.
Mão esquerda de fora da janela, pele arrepiada, braço a sentir o ar, deixo a cinza cair deste cigarro marcado pelo vermelho dos meus lábios, com o fumo a subir lentamente para a atmosfera, fazendo desenhos à medida que se torna num astronauta a explorar mais um espaço e mais uma estrela.
Estou liberta, solta, sem nada que me prenda.
Sinto-me bem agora, de cada vez que me elevo acima dos prédios e das nuvens para observar os faróis nas noites, a maneira como eles se partem em quatro na hora dos reflexos e dos segredos que se partilham com as pessoas mais íntimas. Embebida pela vertigem, parto à conquista de miragens e insatisfações, de um sinal de humanidade e consciência, de um abismo que me possa acolher e abraçar.
As paredes desfocam-se consoante a velocidade aumenta, os sinais perdem-se no verdadeiro sentido da palavra e as minhas costas exibem as cicatrizes de cada frustração e desencontro com o amor e o acaso. Se existem anjos neste mundo eles ainda não me encontraram."
Abismos (2008-2009)
Fotografia: Lúcia Costa
Palavras: Nuno Almeida
7 comentar
Click here for comentarneste palco iluminado desenhamos com as mãos reflexos de anjos.
Replyreverberações de partilha..
E que bela partilha. :)
ReplyGostei do que escreves. :)
o nosso interior queima , quando estamos sós ... porque estamos sós ? mesmo com uma multidão de gentes anonimas ... anonimas , é isso , precisamos do calor , da luz, de musica
ReplyPor vezes o nosso interior queima, quem sabe por causa do que temos dentro de nós, que só por si pode ser calor suficiente para incendiar planetas...
Reply:)
Uau!.. :) Aqui escreve-se! Sim senhora... :)
ReplyGostei do texto! :)
**
:D
Reply:)
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