György Lukács e o parque Szent István


Muitos jardins cuidados, com flores de várias cores a formarem padrões de extremo bom gosto, estátuas particulares. Esta é uma das características que senti na Hungria, com ênfase em Budapeste por ter sido a nossa casa durante dois anos.


O parque Szent István (São Estêvão) pode considerar-se como mais um pequeno segredo da cidade. Isto acontece, em parte, devido à sua localização próxima da popular Ilha Margarida (que ofusca qualquer parque em redor), mas também por estar algo escondido dos caminhos habituais. Tal não impediu que o visitasse com o intuito de ver e fotografar algumas das suas estátuas em específico, com destaque para a de homenagem a György Lukács. Esta última é igualmente a razão para que este artigo surja neste momento devido à polémica recente de a Câmara Municipal de Budapeste ter decidido remover a sua estátua.

Por vezes, não é fácil separar a obra/criação de um autor de outras características suas.
Nos tempos que vivemos, em que existe um foco nas redes sociais para a propagação de notícias, a primeira reacção que tende a surgir é a de revolta e o ultraje. Se atendermos que György Lukács é um filósofo com algum nome e importante na área da crítica literária (entre outras), logo compreenderemos a motivação que subjaz a tais reacções. Porém, estamos a falar da Hungria e, no caso de Lukács, há todo um historial político ao serviço do Comunismo (de forma activa, como membro de governos e com alguns episódios negros) a ter em conta e que assume um peso fulcral. O Comunismo é hoje um dos assuntos tabu no país devido ao sofrimento causado pela ocupação do regime soviético. Se considerarmos a sua orientação política actual (conservadora e de direita), ou que a proposta para remoção da estátua partiu de um membro do partido Jobbik (extrema-direita) – que se serviu das ideias políticas de Lukács e (de forma mais dissimulada) da origem judaica do seu nome verdadeiro para a sustentar –, torna-se fácil encontrar justificação para lógicas binárias de a favor ou contra, mas a questão, como já vimos, tende a ser mais delicada do que parece. Motivações políticas à parte (que são importantes, note-se), acredito que não devemos simplificar e apelidar logo de comunista ou fascista qualquer pessoa que exprima a sua opinião sobre este assunto se esta for bem fundamentada, até porque esse é o tipo de combustível que alimenta o ódio entre as pessoas. Apesar de não ser um caso tão extremo, em Portugal temos o exemplo do escritor vencedor de um Nobel da Literatura, José Saramago, que ainda hoje divide muitas pessoas devido às suas convicções políticas, o que o levou, em parte, a exilar-se voluntariamente em Lanzarote (de 1992 até ao dia da sua morte, 18 de Junho de 2010), ilha espanhola pertencente ao arquipélago das Ilhas Canárias. Por vezes, não é fácil separar a obra/criação de um autor de outras características suas.


Localizado no Distrito XIII, o parque Szent István é um pequeno refúgio do reboliço das ruas que o ladeiam. O lago com repuxos e flores em redor, assim como a estátua de homenagem a Raoul Wallenberg (diplomata sueco que salvou mais de 60.000 judeus húngaros durante a ocupação da Hungria pelos nazis na Segunda Guerra Mundial), são outros pontos de interesse que podem ser encontrados na área. Ficará certamente mais pobre sem György Lukács e é de lamentar que o parque, assim como o país, sejam motivo de notícia pelos piores motivos. A referida estátua pode desaparecer, mas a obra e o passado continuarão vivos, com tudo o que isso acarreta de positivo e negativo.