What Remains: The Life and Work of Sally Mann

Primoroso, de uma sensibilidade palpável. O impacto que este documentário consegue deixar em nós é tremendo. Tal como o título indica, o foco está na famosa fotógrafa Sally Mann, responsável por algumas das melhores e mais icónicas imagens de sempre, entre elas as polémicas fotografias dos seus filhos de quando eles eram pequenos. Uma das facetas mais interessantes desta obra é observar o processo de algumas dessas fotografias, mas também ver posteriormente os filhos já crescidos e a relação entre toda a família.









Há uma vertente humana neste documentário que nos desarma e que, ao mesmo tempo, nos fascina. Muito mais do que falar de fotografia, esta obra fala-nos de pessoas reais como nós, do amor que une Sally Mann ao marido e da reacção dela à notícia da doença rara que o aflige. Uma história de devoção e confiança que é um privilégio podermos observar assim tão de perto. Temos oportunidade de entrar no dia-a-dia desta família que reside numa quinta no sul dos Estados Unidos, perceber a sua relação com a natureza, com os animais, um diálogo constante entre a vida e a morte que inspira a artista de forma constante. Além disto, o documentário mostra-nos também alguns dos métodos que levaram à criação de muitas das suas fotografias, num processo maravilhoso que começa desde logo no uso de máquinas fotográficas antigas de grande formato, até à concretização da ideia com a revelação dos negativos. Curiosamente, isto chega a acontecer na parte de trás da sua carrinha em algumas das fotografias.


Para quem está de fora, olhar para a vida destas pessoas dá-nos inúmeras vezes a ideia de que elas são alienadas e que vivem num mundo à parte, mas isso não é mais do que acontece a todos nós quando vivemos com alguém e construímos a nossa pequena bolha. É dentro dela que tudo faz sentido e, neste caso, sentimos estas pessoas como reais, próximas de nós, muito longe do elitismo e estranheza que nos provocam muitos artistas e a vida que os rodeia. A empatia que sentimos desde início é um dos trunfos deste documentário, mesmo que algumas partes nos deixem desconfortáveis como é o caso do segmento em que Sally Mann visita um espaço onde residem cadáveres em vários estados de decomposição ou de quando fala da morte de alguns dos seus animais de estimação. Mas vermos depois como ela transforma esses momentos em fotografias maravilhosas é impossível de explicar, tal como também acontece com as suas fotografias imensas das paisagens do sul dos Estados Unidos. Um misto entre sonho e conto de fadas negro de uma beleza que não conseguimos descrever.


What Remains é um retrato íntimo de uma das melhores fotógrafas ainda vivas. É um documentário que tanto nos inspira e que faz com que dormir seja impossível, como também nos faz sentir pequenos perante o que acabámos de assistir, a qualidade do trabalho de Sally Mann e de todo o processo, palavras e ideias que envolvem a criação das suas fotografias. É um documentário que nos deixa um brilho nos olhos.